Nem Premier League, nem LALIGA: como CBF quer fair play financeiro que ‘não vai quebrar clubes’

A CBF publicou na última segunda-feira (9) uma portaria que institui a criação do Grupo de Trabalho (GT) para elaborar a proposta de Regulamento do Sistema de Sustentabilidade Financeira (SSF), ou, em resumo, o fair play financeiro. Ainda em trabalho inicial, a promessa mais concreta da confederação é de que o modelo não será igual à Premier League ou LALIGA, já estabelecidos há tempos – e nem que vem para ‘quebrar’ clubes.

O que tanto os exemplos europeus como a futura diretriz brasileira têm em comum é: impedir gastos maiores do que arrecadação. O objetivo é controlar o “endividamento galopante” dos times do país, como especificado pelo vice-presidente da CBF e líder do GT à ESPN, Ricardo Gluck Paul, em entrevista exclusiva. O dirigente espera um debate longo e de “peito aberto” no que se refere a punições e consequências de futuros descumprimentos.

O Grupo de Trabalho será composto por: representantes da CBF, representantes de clubes das séries A e B do Campeonato Brasileiro, representantes das federações estaduais e consultores técnicos independentes – que a confederação garante que não serão escolhidos por indicações políticas. Os nomes, porém, são uma incógnita.

Não é garantia que todos os clubes participem da discussão, e o número de interessados servirá como ponto de partida para qual será o modelo de debate. “Não temos uma visão de quantos vão se inscrever. A partir dessa quantidade é que vamos definir um programa”, explica Ricardo, que garante que o “documento final” levará em conta as “visões, dores, perspectivas e experiências” dos participantes.

O que o vice-presidente da CBF pode adiantar é que o grupo não opera baseando-se fielmente em modelos já existentes em outros lugares. “Não dá para você imaginar que algo que dê certo de uma forma fora do país vai dar dentro”, ressalta.

Como funciona o fair play financeiro em ligas da Europa

Na LALIGA, por exemplo, o fair play financeiro é chamado de “Limite de Custo de Plantel Esportivo” (LCPD), que intervém no quanto um clube pode gastar suas receitas com contratações, que vai de 50% a 60%. Essas arrecadações devem ter viabilidade comprovada e receitas incertas não são inclusas no cálculo de orçamento. As punições por descumprimento englobam perda de pontos, redução de elenco e, em casos mais extremos, rebaixamento.

Outro modelo já há muito tempo estabelecido é o da Premier League, chamado de Rentabilidade & Sustentabilidade (P&S). Nele, os clubes tem um limite máximo de prejuízo por três temporadas e do quanto desse valor pode ser reposto pelos proprietários. Investimentos em categorias de base e estrutura também são contabilizados. O castigo mais ‘radical’ por violações é a perda de títulos e desqualificação de competições.

Ricardo Gluck Paul garante que ambos esses modelos vão ser “bem diferentes” do brasileiro. “Já tem alguns desenhos iniciais para debate”, adiantou o dirigente. “A partir disso (conversas), vamos entender quais clubes preocupam, quais não e, aí, começar a criar um modelo. Isso é para não criar um clima caótico”, afirmou, prevendo uma possível tensão de instituições do país a possíveis penalidades.

Não gastar mais do que arrecada é, talvez, o ponto mais discutido entre os torcedores quando se é falado em fair play financeiro, mas a estabilidade financeira de clubes com dívidas bilionárias foi um ponto muito reforçado pelo vice-presidente da CBF à ESPN. “Será uma oportunidade de, junto com eles, construir uma recuperação ou uma trajetória que os traga de volta para a viabilidade”, pontuou.

As últimas três janelas de transferências do futebol brasileiro tiveram gastos de mais de R$ 1 bilhão em contratações. Em 2025, o Palmeirase o Botafogo lideram a tabela dos que mais investiram, com R$ 232,76 milhões e R$ 179,16 milhões, respectivamente.

O clube alviverde teve, em 2024, receita de mais de R$ 1,2 bilhão; dessa maneira, o gasto com contratações em janeiro de 2025 corresponde a cerca de 19% do faturamento. O alvinegro carioca, por sua vez, prevê cerca de R$ 700 milhões de receita; assim, os custos com transferências corresponderiam a 25%. Sem levar em conta receitas incertas e outras nuances dos balanços, eles estariam em dia com o modelo espanhol, por exemplo.