Onde se forma a excelência: árbitros da Série A vivem semana de treino, troca e evolução no Rio

Durante a pausa do Brasileirão, 64 profissionais participam de treinamentos teóricos, práticos e físicos em três turnos diários; ação reforça compromisso da atual gestão com excelência, inovação e valorização da arbitragem nacional.

Uma intertemporada com três turnos diários de treinamentos durante uma semana. Pode parecer, mas esta não é a programação de um clube durante a pausa do Campeonato Brasileiro, mas de 64 profissionais de arbitragem. Eles participam de uma Intertemporada promovida pela Comissão de Arbitragem da CBF, programação que faz parte dos investimentos da atual gestão na busca por excelência do quadro de árbitros nacional.

Este é o segundo treinamento promovido pela Comissão de Arbitragem da CBF em 2025. O primeiro ocorreu em abril, antes do início do Brasileirão, e serviu para um “alinhamento de expectativas”, conforme definiu Rodrigo Cintra, presidente da Comissão. O reflexo disso se deu em números: nas 110 partidas disputadas em 11 rodadas de Brasileirão até agora, foram registrados apenas nove equívocos pontuais.

Já na intertemporada, o trabalho vem sendo feito em várias frentes. Entre os objetivos está a aproximação de critérios utilizados entre os árbitros, a troca de experiências entre eles, ajustes em análises do VAR e o encorajamento para aumento das decisões em campo, além de palestras voltadas para aprimorar a inteligência emocional dos profissionais de arbitragem. “Isso é fundamental para que o árbitro esteja sempre íntegro para tomar as decisões certas na hora certa. A inteligência emocional traz também o equilíbrio para estas decisões, permite ao árbitro ter uma percepção do comportamento do jogador, evitando algum tipo de confronto que comprometa a credibilidade do árbitro”, explicou Cintra.

A programação se divide entre dois locais: o Clube da Aeronáutica (CAER), onde acontecem as atividades práticas em partidas entre equipes sub-20 e testes físicos e fisiológicos, e o Centro de Excelência da Arbitragem Brasileira (CEAB), com análises detalhadas sobre os recursos do VAR.

No CAER, os árbitros, assistentes e árbitros de VAR se dividiram em três estações de trabalho: um campo equipado com duas cabines de VAR (uma para atuar diretamente na partida e outra exclusiva para treinamento) e instant feedback (cabine em que uma comissão registra em tempo real os lances da partida para uma revisão de lances capitais com o árbitro de campo ao término do jogo); um segundo campo equipado apenas com instant feedback; e um espaço para atividades físicas e exames de saúde.

No campo equipado com VAR, os árbitros se revezavam em turnos de 15 minutos. Paulo Belence, do quadro da Federação Pernambucana de Futebol, foi escalado para apitar o período final da partida entre Portuguesa e Boavista sub-20. Ao fim do jogo, foi direto para o instant feedback. “Isso é extremamente rico, um feedback instantâneo, só sai do campo, toma água, respira e vamos assistir. Às vezes a sensação é a de que estava tudo certo, aí vamos com os instrutores e vemos os detalhes que precisam ser corrigidos. Para nossa carreira, nossa construção, é muito importante”, disse ele.

Outro ponto destacado por Belence foi a chance de interagir com Darío Ubriaco, uruguaio que é instrutor de arbitragem da FIFA e integrante da Comissão de Arbitragem da Conmebol. Ubriaco elogiou a estrutura montada pela CBF para o evento em termos de simulações de situações de jogo que serão úteis para o dia a dia dos profissionais.

Darío Ubriaca durante treino da arbitragemCréditos: Rafael Ribeiro/CBF

“A estrutura está perfeita. E além do campo em si, tem também devolutivas com instrutores, trabalhos de cabine de VAR. Tudo isso melhora a arbitragem e consequentemente o futebol”, disse ele, um fã declarado do futebol e da arbitragem brasileira. “O árbitro brasileiro dirige um futebol bonito, mas difícil de dirigir. Para mim, sempre estão em um ótimo nível de arbitragem, têm muito conhecimento da regra. O árbitro sempre vai a campo para ser justo. O momento aqui é para buscar sempre melhorar mais”, completou.

Um dos exemplos recentes do alto nível da arbitragem brasileira é Daiane Muniz. Ela iniciou sua trajetória dentro da cabine do VAR (que lhe rendeu o prêmio de melhor árbitra de vídeo do Campeonato Paulista deste ano) e seu domínio da regra e a maneira como se comportava nos bastidores chamou a atenção do presidente da Comissão de Arbitragem, que a convidou para assumir o apito.

Após boas atuações em partidas das Séries C e B do Campeonato Brasileiro, ela foi escalada para apitar a Copa América Feminina deste ano, no Equador. “A convocação para a Copa América é como uma convocação para a Seleção Brasileira. Eu vou representar meu país, vou vestir a camisa do Brasil, é assim que eu me sinto. E muito honrada, todos nós, acredito, estamos orgulhosos por ver as nossas equipes em uma competição FIFA, uma competição internacional, fazendo belos trabalhos”, disse.

Daiane Muniz durante treino da arbitragemCréditos: Rafael Ribeiro/CBF

Preparação física

Para estar em cima do lance, o árbitro precisa de uma preparação física similar a dos jogadores de futebol. Por isso, hoje o dia a dia dos juízes conta com analistas de desempenho, profissionais que até pouco tempo integravam apenas o staff dos clubes de futebol.

O professor doutor em Educação Física Emerson Filipino é o consultor científico responsável pela avaliação física, monitoramento e aprimoramento físico dos profissionais, a partir de trabalhos técnicos, táticos e físicos para criação de indicadores fisiológicos dos árbitros. “Só para a gente ter como exemplo: um jogador de futebol profissional desloca em torno de 10 quilômetros numa partida, e o árbitro também desloca 10 quilômetros. Lógico que tem as particularidades, mas o trabalho básico é a parte física”, explicou Filipino.

Emerson Filipino durante treino da arbitragemCréditos: Rafael Ribeiro/CBF

Entre os testes feitos durante a avaliação, os árbitros fizeram trabalhos específicos para mensuração de flexibilidade e força – e se engana quem pensou que o árbitro Anderson Daronco foi o vencedor no último quesito. “O campeão nesse foi o Bruno Vasconcelos, que chega a 70 de pressão manual, nível de um atleta de arremesso de peso”, disse Filipino. O jogador que estiver em campo em um jogo de Vasconcelos deve caprichar na disciplina, já que para levantar um cartão amarelo não custa nada.